Como a sujeira pode salvar nossas crianças…

A revista Time traz uma reportagem sobre um livro recém-lançado nos EUA: “Deixe que eles comam sujeira: salvando seu filho de um mundo limpo demais”. Os autores são B. Brett Finlay e Marie-Claire Arrieta, ambos professores de microbiologia nas Universidades de British Columbia e Calgary, cientistas de renome mundial na área de infecções bacterianas.


Muitas famílias de hoje têm medo de deixar as crianças se sujarem, principalmente pela noção de que podem adoecer pelo contato com micróbios. Este é um dos motivos pelo qual as crianças passam hoje muito menos tempo em ambientes abertos e naturais do que há 20 anos.

Mas esta é uma noção errônea. Durante milhões de anos, as crianças cresceram em constante exposição aos micróbios do seu entorno. Considere o comportamento normal de um bebê desde o nascimento: bebês colocam continuamente suas mãos, pés, e todo objeto a seu alcance na boca. Crianças mais velhas amam brincar na terra, cavar buracos, mexer na lama, pegar bichos, rolar na grama…. este comportamento natural é provavelmente desenhado evolutivamente para que ela tenha contato com muitos micróbios e, desta forma, estimular e formar seu sistema imunológico, para que ele mais tarde possa a reagir a micróbios causadores de doença.

Em nosso estilo de vida atual fazemos o contrário: nos esforçamos para tornar o ambiente estéril, numa sociedade dominada pelo risco e pelo medo. Mas pesquisas recentes mostram que isso é prejudicial para a saúde das nossas crianças. Há uma ligação direta entre a falta de contato com micróbios, e portanto a pobreza do microbioma intestinal (as trilhões de bactérias que nos habitam e participam de diversas formas do equilíbrio de nosso organismo) e a ocorrência de doenças como asma, alergias, obesidade, diabetes e doenças autoimunes. Evidencias apontam para a importância das bactérias até mesmo para o desenvolvimento saudável do cérebro.

É muito importante expor as crianças a uma ampla variedade de bactérias. Vejam aqui algumas sugestões de hábitos saudáveis para uma boa convivência com esses bichinhos do bem:

1 – Se sujando! Quando na natureza – parques, florestas, áreas verdes, praia – permita que seus filhos ponham as mãos em qualquer coisa (dentro do razoável, claro): terra, lama, plantas, insetos, etc. Traga um balde, um pouco de água e uma pá na próxima ida à pracinha e em breve as crianças estarão se refestelando na lama. Se a boca estiver pelo caminho, não se preocupe: logo eles vão perceber que o gosto é ruim e não vão fazer da lama uma refeição gourmet.

A maioria das crianças tem o desejo inato, natural de se sujar, mas com a vida moderna, essa prática precisa ser estimulada e cultivada. 

2 – Deixe seu cachorrinho brincar (com segurança) e interagir com seu bebê ou criança pequena. Deixe-o lamber seu filho (sim!). Claro que é importante levar o cão ao veterinário, para se certificar que está em boa saúde. Uma pesquisa recente mostra que deixar o cão lamber e interagir com a criança pode reduzir o risco de alergias e asma, além dos benefícios da amizade, lealdade, afeto e brincadeiras que um cachorrinho traz. Os animais trazem para o bebê os bons micróbios que ele precisa.

3 – Evite o uso cotidiano e constante de sabonetes desinfetantes e álcool gel. Dê banho com sabonetes normais, a não ser que um médico prescreva um antisséptico. Depois da brincadeira ao ar livre, lavar as mãos de uma criança com sabonete antibacteriano destrói os benefícios gerados pelo contato com os bons micróbios. Além disso, o uso prolongado de sabão antibacteriano aumenta a resistência microbiana.

4 – Ofereça comida de verdade, rica em fibras e livre de agrotóxicos. A maioria das boas bactérias fica na parte final do intestino (o cólon ou intestino grosso). O alimento precisa chegar até elas. Açúcar, farinha branca e outros alimentos processados ou refinados são absorvidos rapidamente no estômago e no intestino delgado, e não chegam até os micróbios. Alimentos ricos em fibras, castanhas e nozes, legumes e verduras são ótima “comida de micróbio”, e as bactérias participam ativamente da sua digestão. Alimentos fermentados como iogurte, coalhada, kefir, tembém são boas ideias para enriquecer nosso meio ambiente intestinal.

5 – Evitando os antibióticos quando possível: eles podem ser milagrosos e salvar vidas em doenças bacterianas, mas não são tão inofensivos como se pensava. Destroem indiscriminadamente a microbiota de nosso organismo, matando as bactérias boas e más. Isto causa desequilíbrios e, como vem se estudando, pode contribuir para o risco de asma, alergias, obesidade, diabetes e muitas outras doenças modernas que estão nos afetando cada vez mais cedo. 

Antibióticos funcionam apenas contra infecções bacterianas, e são inúteis nos quadros virais. Por isso eles precisam ser utilizados criteriosamente. A grande maioria das febres iniciais, especialmente em crianças que estão bem, são causadas por vírus. Cuidado com a automedicação e a prescrição de balconistas de farmácia. Não procure a emergência para um simples resfriado. Ligue para seu pediatra e procure uma orientação que permita evitar o uso excessivo e desnecessário.

E o pior de tudo: por causa do excesso de uso, muitos micróbios são agora resistentes a antibióticos que costumavas ser eficazes. Isso está gerando a ameaça global das super-bactérias, que recentemente gerou um sério alerta da OMS.

6 – Se possível, evite consumir carne de animais provenientes de fazendas industriais. Eles são intoxicados não só de antibióticos, mas também de outras substâncias que podem ser nocivas, além dos horríveis maus tratos a que são submetidos (como bovinos e suínos). Frango, salmão e o peixe panga (importado maciçamente da China) parecem estar entre os piores. Estes antibióticos também afetam nossa própria flora intestinal.

Em suma: a velha história da vitamina S era verdade. Um pouco de porcaria “engorda e faz crescer”…..

Fonte: http://time.com/